quinta-feira, 23 de junho de 2011

Vertigem

Era quinta-feira. Luísa pensou que fosse sábado. Acordou ao meio dia, passou horas na cama juntando forças até finalmente conseguir levantar. Havia tido um pesadelo, não lembrava ao certo o quê, mas cenas de alguns filmes, fossem estes reais ou irreais, passaram-lhe pela cabeça. Tinha uma leve enxaqueca e a garganta doía, seria esta indisposição apenas um indício de mais uma crise de saúde? Não importava. Ela não havia bebido, lembrou, então o único motivo para aquela sensação que se assemelhava por demasia à ressaca, só podia ser uma virose. A enxurrada de pensamentos que há tanto lhe assolava persistia. Luísa fez um café e tomou uma xícara cheia daquele líquido quente e amargo, que sem sombra de dúvidas a ajudava a lidar com toda e qualquer situação. Só não sabia, ao certo, com que situação queria lidar, embora isso não passasse de um detalhe. Encostada na mesa da cozinha, Luísa chorou. Sem saber o porquê, sem precisar de um motivo, só pela falta. Não pela falta de ninguém, desta vez, mas por algo que faltava e era abstrato demais para se explicar, por mais que a si própria. Diferentemente de tantas outras situações tão iguais, desta vez ela não precisava de alguém que lhe abraçasse, segurasse sua mão, ou só ouvisse seu choro. Luísa precisava se purificar. Sempre haveria uma coisa ausente e essa ausência sempre faria toda a diferença, sempre doeria de diferentes maneiras, e sempre se faria presente e notável o bastante para lhe tirar o sono. Que sono? Luísa não sentia sono. Noites inteiras em claro, observando a lua virar sol e escutando o silêncio da janela do seu quarto. Se dormia, eram os calmantes. Fortes o bastante para fazê-la dormir, mas não para fazê-la esquecer. E eis a dúvida: esquecer do quê? A resposta é nítida: do labirinto. Só o labirinto justificava tudo, é como se fosse para ela uma bússola, confusa, mas ainda assim uma bússola. Independentemente de qual fosse o momento, o labirinto era a única coisa capaz de responder todas e quaisquer perguntas. E tudo num labirinto dependeria de dois fatores: da paciência e da sorte. Sim, eu sei que é normal, que muitos têm paciência de sobra para lidar com os empecilhos da vida, mas sem a sorte de nada adianta. Como uma gangorra, se não houver um peso equivalente do outro lado, será completamente impossível, mesmo que por fração de segundo, transformar aquele constante movimento de inconstância numa reta perfeitamente equilibrada. O labirinto podia fazer com que você se perdesse ou se salvasse, só dependeria desses dois fatores. E era nisso que Luísa pensava enquanto estava encostada naquela mesa. Luísa estava exatamente no centro do labirinto, o problema é que não tinha a menor idéia de por qual caminho deveria seguir agora, qual seria o mais seguro. O tempo lhe ensinou que poderia haver sorte, não sempre, mas que devia aproveitar todas as boas marés que lhe aparecessem. Isso ela fazia. Sinal de que dentro da sua sorte, residia sua paciência. Tinha tudo para dar certo, estava tudo extremamente perto, só precisava subir mais um degrau. Todavia, o tempo estava acabando. E isto a deixava absurdamente psicótica. Cada vez mais solitária, escondendo-se de todas as maneiras que lhe fossem palpáveis, guardando tudo numa caixa que já estava muito cheia. Então Luísa mais uma vez chorou. Tomou mais um grande gole da sua xícara agora quase vazia. E riu, quase vazias: ela, a xícara... O que está quase vazio ainda não se esvaziou de vez. Ainda resta um pouco. Luísa sorriu. Levantou a cabeça e olhou pro relógio. Havia parado. Mais uma vez Luísa sorriu, o labirinto acabara de lhe mostrar que ela não estava tão sem tempo assim.

4 comentários:

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  2. ... engraçado, também estou sentindo um vazio imenso. é muito abstrato pra se explicar, mas ele existe! ...

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  3. Esse tal vazio é a fonte de toda completude que vamos ter. "Não há como encher uma xícara cheia", para aprender qualquer coisa que seja, precisamos estar vazios. Precisamos até mesmo deste vazio de morte.

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  4. Nada como café para preencher o vazio que está em nós. =P

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