domingo, 19 de agosto de 2012

About the pain. Her pain.

Eram tantas frases soltas, esquecidas e dolorosas jogadas no ar daquela sala, que Luísa não sabia a qual se ater. Sentia-se limpa. Dolorosamente limpa. De uma organização impecável, que chegava a incomodar. Saiu de casa em busca de respostas que já havia encontrado, e que clarearam na mesma proporção em que a noite se tornava mais escura e silenciosa. E se fazia dela, aquele silêncio, que tanto falava. Ventava. Tanto. Tinha dificuldade para acender o cigarro. A menor delas. A cada trago, uma constatação. A cada gole quente de vinho e a cada solo do Pink Floyd, uma nova certeza. Nenhuma alegria, ou quase. A verdade. Ainda assim, complicada. E se despia e falava de si e esperava que o motivo a que tanto se dedicava aparecesse. Mesmo sabendo, de alguma forma misteriosa e irrevogável, que não apareceria. Devia ser sua sina, aquela. Não dela. Não só dela. De uma sequência de gerações. Como ousara comparar, num riso: quase uma nova versão dos Buendía, de García Márquez. Não fazia doer menos. Ainda que tivesse a consciência dos fatos, não poderia alterá-los. Então, tornava-se fácil entender porque se entregava. Porque superestimava dores tão pequenas, aprofundava cortes tão superficiais. Justamente por querer fugir da superficialidade, por lutar por algo diferente. E a impressionava tanto, que a diferença que buscava fosse tão igual a de tantos outros, talvez por saber que não conseguiria nada além. O que poderia trazê-la mais vida que outras vidas? Mas tinha uma dificuldade anormal  em mantê-las. Até conseguia tê-las, ou quase, por tão pouco. Sempre passando perto, nunca conseguindo. Luísa queria mudar o mundo, começando pelo seu próprio. No máximo, conseguiria mudar os móveis do  seu quarto de lugar. Era uma mudança, por mínima. E se acomodou tanto, aquela moça. Como já teve mais esperança. Ardia dentro do peito a confirmação de que era tarde, por mais que fosse cedo. Que todas as oportunidades já haviam sido perdidas, mesmo precocemente. Pensava, inclusive, se aquilo era certo, aquela maturidade forçada, imposta, não só por si, mas também por si. Aprendeu a qualquer custo e o preço foi alto demais para uma mulher que nem sequer era mulher ainda. Era menina, só não sabia brincar. E possuía tantas outras Luísas que tentavam se sobrepor com historinhas bonitinhas ou com realidades paralelas. E tentava tanto continuar sendo forte, mesmo quando a vida não tinha pena de bater, estava conseguindo, supunha. Suposições... Como estas lhe doíam. As incertezas. Martirizava-se pelas incertezas. Luísa era de uma racionalidade doentia e desumana. Podia até repetir para si que talvez fosse toda amor, até seria, até o era também, mas não passava de um cérebro ativo, de uma mente a mil. De alguém que tinha a percepção de cada centímetro que afundava e que afundava cada dia um pouquinho mais. Não sabia qual dos seus figos ainda não estava podre e a figueira continuava à sua frente. Caíam. Eram muitos, mas caíam velozmente. Logo seriam escassos e ela ainda estaria ali, parada. E meu Deus, eu não tenho nem vinte anos e já desisti de ser feliz. O figo caiu, Luísa não tinha culpa, estava podre. Tinha outros... Não condiziam, qual será o certo? Vanessa, ajude Luísa, por favor. Vanessa, tenha pena dela, ajude-a! Aquele da esquerda pode ser o mais indicado, está mais fácil de pegar. É pequeno, pegue outro, Luísa. Você só pode escolher um. A escolha foi feita, agarre-o. Não desista ainda, Luísa! Busque uma escada, pegue o figo certo, não escolha os mais baixos, estes não são pra você. Corra, ainda é tempo. Suba na árvore, você já caiu antes, corra! Não brinque, Luísa, você não é menina, seja mulher. Seja mulher uma vez na sua vida! São tantos figos, só um é fácil. Nem tanto. Ela tenta pegar, escorrega, foge dos seus dedos, parecia pequeno mas é grande demais para os dedos finos daquela menina-mulher. É esse. Só pode ser ele. Não vou soltá-lo. Não vou deixar que você o solte, Luísa. Daqui a trinta anos, se você não tiver nada, você poderá tê-lo, ainda. Tenha. Não deixe esse figo cair. Segure algum, segure este. É o menos apetitoso, é o único que você será capaz de comer. É o seu, mesmo que não pareça agora. Segure-o, fará sentido.

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