segunda-feira, 7 de setembro de 2009

A história a seguir eu escrevi numa noite nada interessante e feliz, foi uma das primeiras coisas que pus no papel. Espero que desconsiderem a forma infantil cujo o tema foi abordado, mas foi a melhor forma de expor o que sentia no momento que eu tive. Infelizmente, minha mente não condiz muito com o que eu escrevi. Mas de qualquer forma, aí está. Sem mais.
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Não tão distante assim.
- Boa noite, Vovó. – disse a pequena Beatriz ao entrar na sala.
- Boa noite, Bia! – sorri.
- Qual história a senhora vai me contar hoje? – perguntava, entusiasmada, a garota.
- Hum.. a de hoje é interessante, hein? Sobre uma coisa que existia quando eu tinha a sua idade, mas infelizmente, hoje não existe mais. – suspirei tristemente.
- E que coisa seria essa? Algo ruim?
- Não, minha querida... Não. Coisa boa, muito boa, por sinal. Mas não conheci tanto disso, quando eu nasci, já estava acabando, vinham as últimas remessas. Mas ainda deu tempo de eu sentir um pouco, de eu saber um pouco, até de eu guardar um pouco. – disse nostálgica.
- Qual o nome dessa ‘coisa’ ? – a menina parecia assustada.
- Amor. – eu disse, enfim.
- Amor? Esse nome não soa bem... Alguma coisa me diz que a senhora mentiu quando falou que era coisa boa. Isso é... estranho! No mínimo! Do que se trata essa palavra?
- Não me espanto em você o desconhecer. Hoje em dia ele não anda mais à solta por aí. As pessoas, no meu tempo, trataram de destruí-lo, aos poucos, e por culpa disso, a geração de vocês desconhece o termo.
- Ah, não sei não, viu? Ficastes estranha ao tocar nesse nome.
- O amor era um sentimento. Mas sentimentos como ele não são mais vistos já faz um bom tempo.
- Sentimentos eu sei o que são... Tristeza, raiva, melancolia... É isso, né?
- Mas esses são só os sentimentos ruins, o amor não era um deles. Ao contrário. É difícil, ou melhor, impossível te explicar ao certo o que seria. Era um sentimento de afeto que antigamente as pessoas desenvolviam por algo, ou alguém. Um gostar, sabe?
- Vovó, não use esses termos. Eu os desconheço. Afeto? Gostar?
- Minha querida, afeto é quando você sente um carinho por uma pessoa, uma vontade de estar ao seu lado, fica bem em sentir sua presença. Gostar é mais ou menos isso também.
- Nossa, que coisa estranha! Deve ser ruim isso de você querer estar sempre perto dos outros. Que nojo! Invasão de privacidade até, eu diria. Eu acho que não sinto isso por ninguém, não. Ainda bem.
- É. Também não me espanto de você achar isso. As coisas mudaram, e realmente não é nada normal se gostar de alguém hoje em dia. Eu antes gostava, sentia afeto, e até amor, pelas pessoas. Mas hoje em dia a maioria delas me assustam.
- Hum hum – a menina parou, e pensou – Mas vovó, me explica direito o que é o amor, eu ainda não entendi.
- Bom... Antigamente, também existia uma coisa chamada amizade.
- Ai ai, lá vem você com esses nomes estranhos de novo, pára com isso! – interrompeu a garota – O que seria ‘amizade’ ?
- Amizade, assim como amor, não é um termo que dê para ser explicado. É como um afeto também. As pessoas que a mantinham entre si, eram chamadas de ‘amigos’. – eu ri brevemente – Quanto tempo que eu não pronunciava essa palavra.. Amigo.
- Eu não to entendendo mais nada! – disse freneticamente.
- Eu tinha uma amiga, querida... Uma não, duas. Nós sempre estávamos juntas, gostávamos de estar juntas, riamos bastante, dançávamos, gritávamos, pulávamos... Era tudo tão diferente das coisas de hoje em dia. Naquele tempo, as pessoas tinham muitos amigos. Nós éramos, de certo modo, já uma exceção, por sermos poucas. Eu conheci gente, que chegava a ter até 10 amigos, dá pra acreditar?
- Que horror! Eu acho que eu não tenho nenhum amigo, nem quero ter. Que coisa mais chata isso de ‘grudar’ nos outros. Eu, hein!
- Não fique assim, nem diga isso. Hoje em dia a amizade também se extinguiu. Há uma década mais ou menos, foram embora os últimos esboços de amizade que ainda pairavam pela terra. Meus amigos morreram. Minha família, pela qual eu também tinha um grande amor, também morreu. Eu só tenho você, e seu pai. Vocês são minha família agora. E eu creio, que por ser a mulher mais velha do planeta, eu seja a única que ainda ame. Pois eu amo vocês.
- Vovó, acho que a senhora ta velha mesmo. Isso de amor, amizade. Que coisa mais esquisita. Acho que você está enlouquecendo. Vou falar com o papai pra te colocar num asilo, lá eles vão te medicar, e cuidar de você até o dia da sua morte.
- Faça o que bem entender, minha querida. Eu não faço mais questão de estar viva, de todo modo. Melhor seria se morresse, infelizmente cá estou. Mas antes, permita-me continuar a história.
- Certo. Termine-a, então.
- Bem, é uma história que aconteceu comigo. Eu tinha um pai, uma mãe, um irmão, duas avós, um avô, tios, tias, primos, minhas duas amigas, e minha quase mãe. – eu novamente ri, ao lembrar do passado como quem lembrava de um sonho bom.
- Hum... Quanta gente! Prossiga.
- Eu os amava, os amava muito. Gostava do cheiro, do riso, da brincadeira. Tanta coisa entre si. Embora brigássemos, sempre continuávamos juntos. Era engraçado, eu não os conseguia odiar, por mais que eles me estressassem.
- Ódio eu sei o que é, eu odeio algumas pessoas, principalmente as da minha escola, odeio todas elas, são todas estúpidas. Estresse eu também conheço, é aquilo que o papai sempre tem, e chega em casa brigando comigo.
- Isso, exatamente isso. Mas deixe-me continuar. Eu amava essas pessoas, amava bastante. Naquele tempo já era difícil se amar alguém, mas eu ainda sentia esse carinho gigante. Saudade, tudo mais.
- Saudade eu também sei o que é. Sinto saudade do meu dinheiro quando ele acaba. – ela disse orgulhosamente.
- Os valores mudaram. –prossegui- Antes as pessoas gostavam de pessoas, e hoje as pessoas gostam de coisas. Tudo se inverteu, antes as coisas só serviam para serem usadas. Nada além. Eu lembro-me do dia em que eu chorei, e meus amigos me ajudaram, seguraram minha mão, e me abraçaram. Faz tanto tempo que eu não abraço alguém. Desde que eles se foram...
- Vovó, sua história ta me cansando. Que coisa mais utópica. Melhor acabar logo com isso. A senhora enlouqueceu de vez.
Então, minha pequena Beatriz, pegou o telefone, e ligou para seu pai. Ouvi quando disse-lhe para mandar o pessoal da clínica vir me buscar, que eu tinha tido uma crise novamente, e que ela não mais agüentava isso em mim. Estava na hora de despedir-se, e me mandar embora de uma vez por todas.
Ouvindo isso, juntei o resto das forças que me restavam. Fui até o banheiro, tomei todas aquelas pílulas, que eles passavam para eu me acalmar, de uma só vez. E esperei o momento chegar, imersa em minhas lembranças de um passado quase perfeito. Finalmente ela chegou, depois de tanta espera, aos meus 75 anos finalmente eu faleci. Depois de ter visto partir todos os meus entes, e amigos e queridos. Morri sozinha. Morreu comigo o amor, a última dose desse que havia na terra.
Não fiz falta. Meu único filho e minha única neta, apenas, compareceram ao meu funeral. Nada de lágrimas, nada de remorso, nada de boas recordações. Assim as coisas tinham de ser. Acabou.

3 comentários:

  1. Isso ainda há de ser estudado.

    Por que você não me disse que tinha um blog?

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  2. Mas enquanto existir teimosos assim como eu e vc, por mais q o mundo nos amargue a boca, seremos a última resistência... Interessante como vc sente falta de se alimentar daquilo que vc mais abunda... Já reparou? ^_^

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